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S.T.Azevedo

Prioridades


Enquanto isso, na noite de um domingo qualquer, um suposto diálogo se desenrola


- Nunca gostei de furar fila. Aliás, também não gosto de furadores de fila. Certa vez eu neguei o pedido de uma jovem senhora que, acompanhada de uma criança, pediu para ficar na minha vez


- Essa lembrança, de um episódio acontecido há mais de 70 anos, indica que a atitude não foi algo assim tão fácil de tomar.


- Agora eu vou para o final da fila.

- Será que essa é a decisão correta? Eu também não gosto de furar filas, mas não vejo sentido em deixar a minha vez para os outros.

- Quem é que define a prioridade? O governo federal, os governos estaduais, a imprensa? Por que foi definido assim?

- Penso que há influências de toda sorte. Como não houve uma condução centralizada, a sensação é de insegurança. Soluções diferentes tiveram de ser adotadas, mas eu acredito que a prioridade está baseada em critérios objetivos e bem definidos. Mesmo que a gente discorde dessa ou daquela definição, não vejo uma intenção deliberada de privilegiar ou prejudicar algum grupo. Admito que, se buscarmos casos individuais, encontraremos favorecimentos, mas não seria a regra.

- O meu tempo já passou.

- Discordo. Você faz parte do agora, convive com pessoas no presente e ainda tem um amanhã para sonhar e influenciar.

- E quem é que deveria aplicar a vacina? Você aplicaria a vacina em mim?

- Eu? Para mim a melhor opção são as pessoas que trabalham fazendo isso. Por que essa pergunta?

- Você já assistiu ao filme “A balada de Narayama”? Em Narayama o filho deve levar o pai e a mãe, quando completam 70 anos, para o monte nevado, onde, depois de uma extenuante subida, deve deixá-los para se encontrarem com os ancestrais.

- Acho que entendi a analogia, mas não sei se concordo com a comparação. Os habitantes de Narayama viviam numa situação limite de escassez de alimentos. Entendo que não estamos numa situação limite. Penso que devemos respeitar os mais velhos, não somente por uma questão de humanidade, mas pela busca de uma utopia. Admito que haja quem considere os idosos como um peso para a sociedade - e não são poucos os que pensam assim - mas essa forma de pensar não faz parte dessa utopia.

- Outra lembrança que eu tenho é de quando eu tinha 12 anos. Era necessário aplicar uma injeção numa senhora, mas não havia quem a aplicasse, e eu topei a parada. Lembro-me da pele enrugada e do medo de acertar um osso, não sei bem. Só sei que eu apliquei a injeção.

- Outra lembrança que demonstra a tensão do momento. Foi um ato de coragem realizado quando não se apresentavam alternativas. Esse episódio, entretanto, não invalida o raciocínio de ser vacinado por quem pratica essa arte no dia a dia.

- Eu já estou inscrito na campanha. A minha vez será na sexta-feira.

- Muito bem. Exerça o seu direito sem passar por cima do direito de ninguém.



Esses adoráveis socialistas idealistas nos confrontam com cada uma...


Utopias


Para que servem as utopias? Eduardo Galeano nos dá uma pista. Clique aqui para ver no Youtube.


S.T.Azevedo


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