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S.T.Azevedo

Feliz aniversário




O menino estava acabrunhado, encolhido num canto do salão. Não havia nada para uma criança fazer. Olhei ao redor. Festa de adultos. Poucas crianças.

No teclado o cantor competente animava o ambiente. Animação para adultos.


Eu, como um dos adultos do pedaço, conversava e cumprimentava quem, muitas vezes, só encontro em aniversários.


E o menino continuava acabrunhado em seu canto.


Alguma coisa me impelia a me aproximar dele. Mas como? Estava difícil. Ele estava com a cabeça entre os braços, inacessível. Os adultos que se aproximavam incentivavam-no a brincar, mas ele permanecia empacado.


Passei a circular pelo ambiente, olhando os petiscos. Onde estavam os brigadeiros?

Num descuido dos adultos, num momento em que ele levantou o olhar, com lágrimas escorrendo pelas bochechas, aproximei-me perguntando se ele conhecia um truque. Antes de dar tempo para uma resposta passei a fazer o truque utilizando as minhas mãos.


Ele ficou olhando.


Mostrei o truque novamente, incentivando-o a tentar fazer também.

O começo foi tímido, sem sucesso. Passei a explicar, passo a passo, a sequência de gestos. Ele foi tentando, foi melhorando. Eu ri dos erros dele, e ele riu também.

Passei a mostrar um segundo truque, mais difícil. Começamos a treinar esse.


Nessa hora eu já estava acocorado ao seu lado.


Foi quando o pai dele chegou e interrompeu nossa relação. Não me lembro qual foi o assunto trazido. Talvez algum incentivo para que ele fosse brincar com as outras crianças. Não importa.


Levantei-me. O menino se levantou também e saiu para andar pelo salão. Mais tarde conversei com esse pai sobre amenidades. O episódio não foi mencionado.


Nas despedidas voltei a ver o menino. Repeti um truque. Quem estava ao lado dele disse que ele estava mostrando sua brincadeira pela festa.


Ele olhou para mim. Trocamos um discreto sorriso de cumplicidade. Fui embora satisfeito.


Até outro aniversário, amigo!


S T Azevedo


Observação: quem me mostrou os truques com as mãos foi um tio querido, muito carismático e inquieto. Um professor de português capaz de entrar na sala de aula pela janela, surpreendendo alunas e alunos, desconcertando as coordenadoras.

Ele tinha seus bordões. Aqui vai um que ele gostava de citar, olhando nos olhos dos jovens que o ouviam: “Vou te dar um conselho: Não aceite conselhos!”.



Referências:


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3 Kommentare

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Robson Soares
Robson Soares
30. Sept.
Mit 5 von 5 Sternen bewertet.

Texto massa, Sérgio! 😊

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jucelino almeida
jucelino almeida
28. Sept.
Mit 5 von 5 Sternen bewertet.

Já tive experiências parecidas em festas aqui em casa, sem truques, mas com brinquedos, hoje entrego um Tablet....

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Jacques Nunes
Jacques Nunes
27. Sept.
Mit 5 von 5 Sternen bewertet.

Inesquecível esse bordão do nosso tio Rubens "vou te dar um conselho: não aceite conselhos"

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